domingo, 31 de outubro de 2010

Gosto Familiar


    Há dias em que a vida parece mais leve. Uma tarde; um tema; uma programação diferente para o final de semana; e algum café é o suficiente para um bom papo. Só que agora não são amigos, e sim a figura que para muitos a mais imperialista e governamental de uma instituição familiar. Dentre as preocupações maternas óbvias em seu rosto, ela me perguntava o que estávamos a fazer, e pedia para que eu não mentisse sobre os futuros acontecimentos.
    Eu fui assim cedendo àqueles olhos verdes e grandes de herança mal resolvida, que em choque com o imperador me fez deles só grandes, e não verdes. Disse assim a verdade, onde estaria com quem estaria e quando voltaria – no caso, só no dia seguinte. – Eu comecei em conseqüências de uma informação completa e segura, ir respondendo todas as perguntas, e o que eu achei que seria um interrogatório, acabou virando uma demonstração de afeto entre mãe e filho.
    Vieram então as curiosidades sobre o meu mundo tão diferente do dela, sobre os meus amigos, minhas ações, e meus amores. As preocupações com meu recente namoro fora logo dizimado, o relacionamento já havia sido rompido. Um alívio para uma alma materna. Depois as preocupações com os fatos dos demais amigos, todos eles envolvidos nesse meu mundo, em que sofremos por amores e por dúvidas muitas vezes não respondidas.
    Veio-me a curiosidade sobre o casamento imperial, eu que mal conhecia o imperador, procurei perguntar o que ela havia visto de tão fascinante e sedutor em meu pai, e porque ela rendera seu coração tão jovem e silvestre para tal membro urbanizado. Ela me disse que na época ele era diferente, do mesmo jeito em que ele tratava os amigos de forma carinhosa e alegre, ele a tratava. Eu retruquei dizendo que em certos – raríssimos – momentos ele ainda era assim. Ela por sua vez concordou, mas mesmo assim afirmou que antes esse comportamento juvenil era mais freqüente.
    Depois de tudo resolvido e questionado, chegamos à conclusão do que seria feito e do que era certo e errado para ser feito no final de semana. Com aquela doce impressão na boca do café, em que o tempo provara para nós dois – mãe e filho – que o tempo sempre permanece atuante, mesmo com resquício do sabor lembrado ou não. Eu sabia que meu pai iria mudar – para melhor ou pior não sabia ao certo. – Mas que apesar disso tudo, eu também mudaria e ela também mudaria. O tempo regia ações na mesma constante em todos nós. Iria me mudar; mudar minha mãe; meu pai; mudar o meu café. Permanecendo só o gosto do passado; do café; do bate papo; e da certeza do amor materno.

terça-feira, 19 de outubro de 2010

A Dor e o Alívio


     Era o marco da porta, e era o meu mindinho. Todo ele, junto aos seus quatros companheiros encaixados à vontade de estar descalço em casa em um domingo. Quando em um movimento mal visto, e em uma visão retorcida de velocidade, vejo-o beijando a beirada do marco da porta entre a esquina de dois quartos. E lá vinha ela seguida de um palavrão abafado pelas reticências. Ela fluía rumo aos meus tendões, viajando a cada bombear de sangue, escalando as escadas do sistema nervoso até chegar ao meu cérebro. É assim a dor.
     Sempre devagar para a consciência, sempre rápida para o desespero. Às vezes ela vem e traz um pequeno inchaço, às vezes é do inchado em que ela veio. Um corte aqui, um raspão ali. O importante é vive-la, como se nunca aquilo um dia fosse passar, e cessar. E depois de todo um processo rápido ou curto de aquisição de posse sobre ela, vem ai uma sensação de como ter um cão raivoso no lugar do machucado. Seus contrastes são como os pelos de um animal. Você sabe que ele é uma fera, só não sabe o quanto bela pode ser e o quanto deve temer-la.
     A dor de nível é uma dor que existem graus de variação, vai de acordo com a profundidade de um corte por exemplo. Existem dores constantes, feito fórmula da Física; Na qual uma delas é a dor de dente. A dor sob preção varia de acordo com a personalidade do sujeito; Se ele mexe demais no lugar, certamente vai continuar doendo. A dor interna pode ser aquela típica dor de barriga, ou às vezes é um tipo de dor que prova no momento que você realmente possui uma alma; A dor do parto é um forte exemplo! Existem dores que vem como terremoto; A cãibra é mestre em exercer essa função, vem balança tudo e depois logo passa. Mas a dor que mais vem sendo sentida e a mais famosa de todas não é a de porte físico, mas sim sentimental. É a famosa dor do amor. Ela é a única que sua medida pode vir a ser imensurável, e a única que pode levar as pessoas a sentirem outras dores.
     O bom é o que vem depois. Alias pra que toda essa filosofia se depois de todo esse sofrimento não podemos desfrutar o prazer do alívio? O alívio é tão famoso quanto à dor. Pois nele nós valorizamos a sinestesia do bem estar. Nele nós conseguimos pela capacidade humana de anacronismo lembrar o quanto aquela dor foi ruim, e assim agradecer aos céus por ter passado. O alívio mais remoto é o contemporâneo, vem com um remedinho que logo faz tudo passar. É desvalorizado pela impaciência dos homens. Não há drama nem cama, para que possa ser depois da dor, desfrutado. Mas existem aqueles alívios que vem depois da fuga de uma diarréia, de uma exprimida a mais no furúnculo, de uma corrente de água gelada na queimadura. Esse alívio natural é delirante! Vem de um ápice de dor, para assim a brisa remota do alívio.
     Sou um tipo de aliado do equilíbrio dos dois. É essas coisas que fazem a vida valer à pena. O que rege a degustação de ambos – tanto do alívio quanto da dor – é o tempo. Só ele fere, e só ele cura. – Às vezes mata, mas não vem ao caso. – Só ele pode nos tirar aquilo que um dia vai ser devolvido, mas sem o nosso consentimento. Quando sentimos dor nossas mentes afogam em um desespero de não haver mais esperança, e daí quando vem o alívio sentimo-nos felizes, mas de uma felicidade serena que só é adquirida com essa valorização de bem estar. Sou também apaixonado pelo tempo, apesar dele me levar em troca justa e fria alguns anos de vida e de saúde, ele sempre me devolve aquilo que eu possuía antes. E é isso que traz à minha felicidade de viver! Mesmo quando o caso do amor é critico e cego, de pensar que nunca vou conseguir deixar de amar algo ou alguém, logo penso no futuro reconfortante de um alívio. Que só o meu amigo tempo um dia pode me trazer.

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Discos Arranhados

     
     E ela era assim, a cada amor desencantado, um disco arranhado. Ela adorava francês, conheceu um cara que também curtia francês. Ela sugeriu Carla Bruni. Eles transaram no carro e quando ela voltou para casa, nunca mais ouviu Carla Bruni. Veio outro. Ela gostava de Bon Iver, e quando ficou com este outro cara, pecou em colocar essa música para tocar. Ela fugiu, ele a procurou e ela nuca mais quis ouvir Bon Iver. Dias nublados, e ela resolve procurar outro. Ela agora ouvia Rachael Yamagata, ele gostava mesmo era de Lady Gaga (fútil). Daí foi ela conceber seus beijos na calsada, e lá foi Rachel ser deletada da sua playlist. E veio do ultimo, ela resolveu tomar jeito. Ela o fez no cinema enquanto tocava OneRepublic, ela gostou dele e de OneRepublic. Resolveu escutar e acabou curtindo. Agora ela prometeu em não fugir mais, e assim selou esse compromisso. Só que o destino resolveu pregar uma peça, e ele que resolveu abandoná-la. E ela? Deixou de ouvir OneRepublic. Ela ainda o quer, mas não o disco do OneRepublic. Pelo menos agora ela ainda tem Ingrid Michaelson e KT Tunstall para ficar lamentando a perda. Enquanto todos os outros vivem suas vidas, ela permanece arranhando os outros discos, sem ouvir os que mais gosta com alguém, pra não ter que arranhá-los. Em fim, dias nublados discos arranhados.

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

A Dúvida


     Estar à deriva, na deriva por deriva. Estática em estado, pior do que estar abandonada é estar em duvida de estar sozinha. Pois é assim que ela se via. A sala, a escuridão, e a noite. Todos os endereços pregados no chão, todas as idéias. O pior de estar assim é ser terrivelmente bonita. Ela havia apostado todo seu amor, jogado pra Lua. Apostado com os astros, que daria certo. Abrir os olhos, e estar chorando no chuveiro.
     Mas as semanas, compostas do tempo apropriado de sete dias cada uma, passou para ela como se fossem meses. Não anos, pois a dor ela não é pior na overdose. Mas é pior quando o gole é perfeitamente bem medido. Sem ultrapassar nem faltar, o tempo contado que foi suficiente para ela ficar sem seu vício. Mas nem lembrar, e nem esquecer. O tempo certo para ela queimar todo o seu coração quando a dúvida vinha.
     E assim ela resolveu após vários dias juntar os papeis. As provas ali impressas à mão, no chão. De tudo aquilo que ela havia colhido durante a presença da substância em que a viciou. Ela pegou tudo aquilo, selou com duas voltas no elástico. De forma que preenchia a sua mão, delicada mão. Ela parava o momento, para se observar.
     Seu rosto era belo, pardo de contrastes ponderados à beleza. Era bonita e cobiçada por certos passantes, em que ela nunca percebia de quem lhe havia gostado ou não. Fazia de seu nariz uma imponência, na qual era a única afronta em seu rosto. Vivia de rosto curvo, baixo rente aos joelhos. Mas seu nariz não. Sempre apontado para frente, avante àquele que atrapalhava, ou incomodava. Seu corpo delgado feito fio de malte, parecia nunca ter fim. O quebrar do seu movimento, o jeito de olhar, olhos de lentes telescópicas apontadas para o céu. Escuros como os céus de noite sem Lua. Grandes e ofuscantes não refletia, apenas refratava de um jeito que fascinavam o observador.
     Saíra de casa, precisava honrar os compromissos, bem atuante com sua tristeza como sempre. Quando ela o avistou. E ele estava lá a observando. Ela já o havia percebido há muito tempo, quando cruzava a esquina. Mas ela preferiu esperar, pois já havia esperado por todas as semanas, e não lhe custava mais esperar um pouco pela àquela visão. Fora ele, o seu vício. Ela estava cansada daquela substancia, e queria não ter mais que enfrentá-la. Mas ele estava lá, e já se aproximava. Ela levantou e o encarou. Trocaram menos de um baile de pares nas palavras. Era o suficiente. Ele não tinha olhos de quem a abandonara. E era isso que a distraia.
     Ele se foi, eles trocaram algumas informações sobre o próximo lugar a se ver. Mas ela não estava certa se o veria, e ele ainda era indecifrável para ela. Mas mesmo assim, estava certo. O destino iria reger da melhor forma para os dois. Ele havia a desculpa ainda atuante, de que era inocente. Ela ainda estava abandonada, mas ainda paciente. O que o tempo curou, voltou a ferir-la. Ela indignada com a volta daqueles sentimentos de dúvida, meteu sua delicada mão novamente no bolso, e de lá tirou os papeis enrolados no elástico. Ela voltou a analisá-los. Ela precisava saber! E ele?! Ele continuava com olhos de quem não a abandonara.
     

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Rolamentos


     Mente moderna, anos avante. Corpo jovem, papo reto. Comunicação aberta, lábia, persuasão, manipulação. Flexibilidade, maleável, adaptação. Situação, exploração. Teste, análise, experiência sem proteção. Infecção. Doença, vício, hiperingestão. Gula, absorção, osmose, estando com fome ou não. Escassez, perda, problemas e mistérios. Escolta, esconde, escalas e curiosidade. Distância, distinto, destino, disperso e saudade. Discernimento. Apuração. Contato e colisão. Realidade, fatos, notícia, manchete e reportagem. Preção. Estopim, conflito, avante em revolução. Atrito, desgaste, arranha com pó ou não. É o fim, que prevejo, nesses termos lidos no contrato ou não. Assino, embaixo, de todo amor, após o X marcado, de caneta azul ou preta na mão.