Estar à deriva, na deriva por deriva. Estática em estado, pior do que estar abandonada é estar em duvida de estar sozinha. Pois é assim que ela se via. A sala, a escuridão, e a noite. Todos os endereços pregados no chão, todas as idéias. O pior de estar assim é ser terrivelmente bonita. Ela havia apostado todo seu amor, jogado pra Lua. Apostado com os astros, que daria certo. Abrir os olhos, e estar chorando no chuveiro.
Mas as semanas, compostas do tempo apropriado de sete dias cada uma, passou para ela como se fossem meses. Não anos, pois a dor ela não é pior na overdose. Mas é pior quando o gole é perfeitamente bem medido. Sem ultrapassar nem faltar, o tempo contado que foi suficiente para ela ficar sem seu vício. Mas nem lembrar, e nem esquecer. O tempo certo para ela queimar todo o seu coração quando a dúvida vinha.
E assim ela resolveu após vários dias juntar os papeis. As provas ali impressas à mão, no chão. De tudo aquilo que ela havia colhido durante a presença da substância em que a viciou. Ela pegou tudo aquilo, selou com duas voltas no elástico. De forma que preenchia a sua mão, delicada mão. Ela parava o momento, para se observar.
Seu rosto era belo, pardo de contrastes ponderados à beleza. Era bonita e cobiçada por certos passantes, em que ela nunca percebia de quem lhe havia gostado ou não. Fazia de seu nariz uma imponência, na qual era a única afronta em seu rosto. Vivia de rosto curvo, baixo rente aos joelhos. Mas seu nariz não. Sempre apontado para frente, avante àquele que atrapalhava, ou incomodava. Seu corpo delgado feito fio de malte, parecia nunca ter fim. O quebrar do seu movimento, o jeito de olhar, olhos de lentes telescópicas apontadas para o céu. Escuros como os céus de noite sem Lua. Grandes e ofuscantes não refletia, apenas refratava de um jeito que fascinavam o observador.
Saíra de casa, precisava honrar os compromissos, bem atuante com sua tristeza como sempre. Quando ela o avistou. E ele estava lá a observando. Ela já o havia percebido há muito tempo, quando cruzava a esquina. Mas ela preferiu esperar, pois já havia esperado por todas as semanas, e não lhe custava mais esperar um pouco pela àquela visão. Fora ele, o seu vício. Ela estava cansada daquela substancia, e queria não ter mais que enfrentá-la. Mas ele estava lá, e já se aproximava. Ela levantou e o encarou. Trocaram menos de um baile de pares nas palavras. Era o suficiente. Ele não tinha olhos de quem a abandonara. E era isso que a distraia.
Ele se foi, eles trocaram algumas informações sobre o próximo lugar a se ver. Mas ela não estava certa se o veria, e ele ainda era indecifrável para ela. Mas mesmo assim, estava certo. O destino iria reger da melhor forma para os dois. Ele havia a desculpa ainda atuante, de que era inocente. Ela ainda estava abandonada, mas ainda paciente. O que o tempo curou, voltou a ferir-la. Ela indignada com a volta daqueles sentimentos de dúvida, meteu sua delicada mão novamente no bolso, e de lá tirou os papeis enrolados no elástico. Ela voltou a analisá-los. Ela precisava saber! E ele?! Ele continuava com olhos de quem não a abandonara.